Zero discrição!

O advérbio é uma classe de palavras entre dez. Ele é tão especial quanto o tempero é para a gastronomia. Termo invariável, como o sal que é sempre sal, a sua forma nunca muda. Fato é que o advérbio, como o próprio nome diz, modifica um verbo quanto está junto a ele, acrescentando-lhe significado ao especificar circunstâncias como tempo, lugar, modo etc. Aliás, o advérbio pode modificar inclusive um adjetivo ou mesmo outro advérbio.

Palavra que modifica um verbo: na frase “Ele escreveu muito”, a palavra muito é classificada como advérbio porque está “junto ao verbo”, que no caso é a forma conjugada “escreveu”. O verbo indica a ação, enquanto a palavra muito intensifica o ato praticado pelo sujeito, pois ele escreveu... muito! A função do advérbio muito é, nesse caso, a de adjunto adverbial de intensidade.

Termo que modifica outro advérbio: é o que acontece na oração “Ele escreveu muito bem”, a palavra bem é o advérbio que na frase indica como a ação de escrever foi realizada: escreveu de que modo? Escreveu bem! Já o advérbio muito, ao ser escrito “junto a” bem, o intensifica, inserindo uma camada a mais de significado, pois diz que o sujeito não apenas escreveu bem, ele escreveu muito bem.

Vocábulo que modifica um adjetivo. Na expressão “Seu texto estava muito bonito”, a forma conjugada “estava” é tão somente um verbo de ligação, que conecta o sujeito da oração (seu texto) ao seu predicativo (muito bonito). Logo, o adjetivo bonito, cujo significado é intensificado pelo advérbio muito, descreve uma característica desse sujeito, que é facilmente encontrado na oração perguntando diretamente ao verbo: o que estava muito bonito? Resposta: o seu texto!

O advérbio é o tipo de palavra “amiga”, que jamais mente, mesmo quando se liga por conchavo, digo, derivação sufixal, a adjetivo feminino, a fim de adicionar precisão à descrição. Portanto, o advérbio é, em bons termos, superinfluente, mas, contudo, porém, entretanto, mostra-se um livro aberto, porque, literalmente, sempre diz um pouco mais dos amigos aos quatro ventos. Não importa se é verbo, adjetivo ou outro advérbio. Zero discrição!

Luciano Borges é Doutor em Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, na área dos estudos discursivos e textuais – literatura, artes e mídias digitais