Hoje trago uma reflexão acerca das pessoas que ainda insistem na ideia de que o “tempo de antigamente” era melhor de se viver, nutrindo um romantismo sobre o passado e seus fantasmas. Longe de querer incitar maniqueísmo entre o presente e o passado, já que ambos têm os seus vícios e deslizes, minha intenção é apenas exemplificar algumas práticas do passado recente que aos poucos estão indo embora e outras que, disfarçadas ou escancaradas, ainda persistem atualmente.

Sou de um tempo em que criança tinha que ir a botecos para comprar bebida alcóolica e cigarro para adultos, pessoas fumavam dentro de lugares fechados sem a menor preocupação e não se usava cinto de segurança. Ainda pior, em qualquer roda de conversa ou almoço de domingo, era hábito ouvir piadas machistas, racistas e homofóbicas. Essas mesmas piadas sem graça eram reproduzidas por crianças dentro das escolas, fato que alimentava o bulling, numa época em que esse termo nem era conhecido. Os programas de televisão aberta exibiam corpos femininos de forma depreciativa, músicas com repertório promíscuo eram consumidas e cantadas pelo público infantil e até a moda selava esse cenário. 

Tudo isso aconteceu nos anos 1990, os quais, nesses aspectos (sem generalizações), foram um ambiente relativamente hostil. Porém, como boteco não é lugar de criança, cigarro não é coletivo, cinto de segurança salva vidas e discriminação não tem graça, concomitante a essas práticas também surgiram leis que combatiam e preveniam esses atos que na verdade eram mentalidades (aquilo que muito lentamente se transforma). Não foi fácil o Estatuto da Criança e do Adolescente se consolidar, as leis serem respeitadas e o comportamento das pessoas começar a mudar. Na verdade, o processo ainda continua, pois, por mais que existam dispositivos da Justiça, algumas dessas práticas das gerações passadas ainda persistem, muitas vezes veladas. As novas gerações são a esperança de que o passado precisa ficar só na História, ele não é uma forma de se viver. Afinal, é sempre tempo de expurgar os fantasmas.

PROFª ESP. KARLA ARMANI MEDEIROS, historiadora, professora de História e titular da cadeira 7 da ABC – www.karlaarmani.blogspot.com / @profkarlaarmani