Pé-direito ou pé direito
luciano-borges - 4 de fevereiro de 2024

Luciano Borges é Doutor em Letras pela Universidade Mackenzie, na área dos estudos discursivos e textuais – literatura, artes e mídias digitais
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Eis a questão
Pé direito, com ou sem hífen? Arrisca um palpite? Ainda que essa dúvida não enrede uma tragédia completa, como a que ocorre em Hamlet de William Shakespeare, seguramente, ela coloca em questão: a forma de um termo em relação ao sentido e ao contexto no qual se insere.
O hífen, a bem da verdade, torna-se um vilão quando aquele que escreve não entende bem a função que este sinal despenha na composição de palavras. A consciência de que ele existe, logo é, torna-se evidente quando este signo gráfico é colocado entre duas palavras a fim de lhes conferir novo valor – propriedade essa dos sinais diacríticos.
Valor? Isso mesmo! A função do hífen é “dizer” concretamente ao leitor que a palavra é composta, como é o caso de pé-direito. Por outro lado, caso um termo como “pé direito” seja escrito sem hífen, o leitor pode entender, seguramente, que não se trata de uma palavra composta.
Do texto à regra: tendo em vista o registro culto, não é correto usar o hífen quando se deseja referir, na língua escrita, que a meia do pé direito da Maria está furada. De fato, há uma meia assim como um pé. Contudo, deve-se empregar o hífen, quando se é instado a escrever, por exemplo, sobre o pé-direito de uma sala.
A altura livre de um andar, isto é, a medida do piso ao teto é, por acepção, o pé-direito de uma sala. Ora, em nada tem a ver com a produção de sentido anterior. Portanto, o termo pé-direito é um composto, porque da união das palavras pé e direito se obtém uma nova unidade de sentido, por intermédio do hífen, que lhe atribui valor.
Dessa breve análise, conclui-se que o uso de uma forma hifenizada não é meramente uma opção, uma vez que a forma, a maneira como se escreve um termo, depende da estrita relação entre o sentido e o contexto no qual o enunciado vem à luz.